A proposta de hoje é trazer algumas reflexões da situação atual e do que esperar dos contratos de locação em vigor, em particular aqueles assinados com empreendedores de centros comerciais e shopping centers, diante do cenário de isolamento social e fechamento do comercio estabelecido por ordem governamental.
Nossa primeira recomendação, logo na implantação das medidas de fechamento do comercio, foi NEGOCIAR, NEGOCIAR, NEGOCIAR. E não faltou coro nessa sugestão. Do lado dos lojistas, uma súplica. Pelos locadores, uma resistência natural seguida do enfrentamento da situação – NEGOCIAR é preciso, OK, mas isentar não. Em termos de resultados, o que conseguimos? Primeiro, que “juntos somos mais fortes”. Os lojistas, em avalanche e carreados por associações representativas do varejo, foram unanimes no pleito de suspensão de todas as cobranças, pelo menos durante o isolamento social e fechamento do comercio, e muitos dos lojistas de fato receberam todas ou alguma contrapartida sobre esse pedido. E isso somente foi possível porque vários locadores perceberam a gravidade da situação, a realidade dos lojistas, suas próprias perdas e a insegurança do resultado de um processo judicial para decidir o assunto.
Muitos lojistas optaram apresentar seus pedidos através da via judicial. Os motivos que levam um empresário a mover um processo judicial são diversos, e nessa reflexão, não queremos abordar os pretextos (que certamente podem ser levantados em uma outra oportunidade), e sim analisar as consequências de uma decisão judicial dessa natureza, dentro do contexto de uma Pandemia.
As primeiras decisões favoreceram os lojistas e fizeram crescer o otimismo nos processos judiciais. De fato, quando as partes não conseguem chegar a um consenso sobre um assunto, a decisão proferida por um Juiz de Direito, mesmo que seja alguém alheio ao relacionamento das partes, levará em conta os argumentos e provas do locador e do locatário para decidir, sozinho, sobre a questão apresentada. Quem não concordar com a decisão, pode recorrer e no processo civil brasileiro, vários são os recursos disponíveis aos litigantes para mudar uma decisão judicial. Isso implica em instabilidade da decisão, longo tempo para obter-se uma decisão definitiva, recursos financeiros para dar andamento ao processo, e o risco da decisão final não ser favorável a quem pediu o socorro da Justiça.
Passados 50 dias, temos notícias de vários processos judiciais envolvendo contratos de locação em shopping centers, cujos resultados são tão diferentes entre si quanto os pleitos dos lojistas. Em comum, apenas o fato dos Requerentes lojistas terem sofrido redução drástica ou nenhum faturamento e/ou estarem impossibilitados de exercer suas atividades.
PEDIDOS | RESULTADOS JUDICIAIS até esta data |
ISENÇÃO DO ALUGUEL MÍNIMO | Concedida a isenção do pagamento enquanto durar o evento da Pandemia. |
Isenção não foi concedia. Concedido o adiamento do pagamento devido. | |
Manutenção do pagamento apenas do aluguel percentual. | |
Concedido o desconto de 50% do aluguel até o fim do estado de emergência. | |
ISENÇÃO DO FUNDO DE PROMOÇÃO | Concedida a isenção do pagamento ao Fundo de Promoçao |
Concedido desconto temporário de 50% na contribuição do Fundo de Promoçao | |
SUSPENSÃO DOS PAGAMENTOS ATÉ O RETORNO DAS ATIVIDADES | Liminar concedida parcialmente apenas para conceder suspensão do pagamento da locacao. |
Negado. A redução do faturamento não dispensa o pagto do aluguel do imóvel que ocupa. | |
Juiz ofereceu a alternativa do lojista renegociar ou terminar o contrato, como permite o Código Civil. | |
REDUÇÃO DOS VALORES COBRADOS | Lojista pagará 30% do valor original do aluguel enquanto durar a crise sanitária. |
Negado. |
O que vemos, na pratica? Incerteza quanto as decisões do Judiciario. De um lado, vários Juizes entenderam que os Pedidos dos locatários deveriam ser atendidos, resumidamente, porque:
– o Código Civil Brasileiro permite a revisão judicial de uma obrigação, se seu cumprimento for evidentemente desproporcional por conta de motivos imprevisíveis, e excessivamente onerosa para uma das partes, e o ônus maior da Pandemia ficou para os locatários, que não querem terminar o contrato, preferindo reequilibra-lo;
– a Pandemia e seus efeitos representam eventos de caso fortuito e força maior, que justificam o não cumprimento de um contrato pelas partes;
– a Lei do Inquilinato prevê a possibilidade de revisão judicial para ajuste do valor da locação ao valor de mercado, após 3 anos de locação;
– os contratos, por Lei, devem cumprir sua função social e exigir seu cumprimento pelo locatário atingido pelos efeitos da Pandemia estaria violando esse principio.
Mas muitas decisões entretanto não tutelaram os pedidos dos lojistas levando em conta, resumidamente, que:
– as medidas de ordem econômica divulgadas pelo Governo Federal para ajudar os empresários, micro e pequenos varejistas, permitiria o pagamento dos alugueres em algum momento;
– o contrato de locação está em vigor, é lei entre as partes e devem continuar a surtir seus efeitos e serem cumpridos integralmente (pacta sunt servanda), de modo que os pagamentos continuam sendo devidos na data de seus vencimentos originais;
Fato é que motivos não faltam para tanto locador quanto locatário solicitarem uma revisão judicial do contrato de locação e, como vimos, há argumentos que convenceram alguns Juízes a não conceder nenhum pedido dos locatários porque os locadores também perderam seu faturamento pelo mesmo motivo do fechamento do comercio e isolamento social. Mesmo reabertos, o medo das pessoas e a instabilidade econômica atual afetaram também diretamente os locadores. A inadimplência dos lojistas, que já mostrava algum ruído, colocou uma pá de cal na esperança de reverter esse quadro, que simplesmente colapsou. Sem receitas, também o locador tem direito de rever o ajuste com seus locatários, e até de terminar o contrato por justa causa, por conta dos eventos causadores da situação atual.
Diante desse quadro de incertezas de quem tem mais razão, 50 dias depois nossa opinião continua a mesma — há margem e respaldo para NEGOCIAR a revisão dos contratos de locação, antes de avaliar os riscos de um processo judicial, abrindo-se aí um leque de possibilidades:
– isenção da cobrança pelo período do fechamento do comercio;
– adiamento da cobrança dos aluguéis para depois da reabertura do comercio;
– renegociação do valor do aluguel propriamente dito, temporariamente ou definitivamente até o final do contrato;
– desconto nas despesas de condomínio, cujos valores também foram ou devem ser reduzidos pelos locadores com a redução de gastos com segurança, limpeza, manutenção, ar condicionado e impostos, entre outros custos;
– isenção total ou desconto na contribuição ao fundo de promoção dos locadores.
A tendência do Poder Judiciário é mesmo de privilegiar a efetiva busca de uma solução intermediária, onde as duas partes saiam dos seus corners dessa batalha e abram mão de suas garantias legais e contratuais para buscar uma alternativa comum e que não prejudique somente uma das partes. Renovação antecipada permitem melhores condições de negociação; cobrança de aluguel somente percentual sobre o faturamento bruto do lojista; fixar um valor mínimo de aluguel que seja efetivamente mínimo e não ideal; trazer à mesa as novas formas de comercio online (incluindo as de alguns shoppings) usando a loja física na operação também podem ser oportunas; estabelecer parcerias novas com o empreendedor também pode gerar uma renda extra às Partes. E várias outras propostas podem ser construídas, mesmo que antes impensáveis, por que não?
Ideias, sugestões, experiencia e paciência não faltam à nós. Esperamos poder ajudá-los!
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